segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Cineclube


Bem pessoal como foi combinado, o filme mais votado seria o filme escolhido para passar na sessao cineclube de sabado.
The Oscar goes to...........Roma Cidade Aberta.
Preparem a pipoca e chimarrão e bom divertimento a todos.

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Cineclube


Bem, amigos estamos novamente com o blog a disposição de todos para a disciplina de cinema....
Como combinado a relação dos tres filmes que serao apresentados para a escolha de um deles por voces para passarmos no dia 27/set

Janela da alma - Dezenove pessoas com diferentes graus de deficiência visual, da miopia discreta à cegueira total, falam como se vêem, como vêem os outros e como percebem o mundo. O escritor e prêmio Nobel José Saramago, o músico Hermeto Paschoal, o cineasta Wim Wenders, o fotógrafo cego franco-esloveno Evgen Bavcar, o neurologista Oliver Sacks, a atriz Marieta Severo, o vereador cego Arnaldo Godoy, entre outros, fazem revelações pessoais e inesperadas sobre vários aspectos relativos à visão: o funcionamento fisiológico do olho, o uso de óculos e suas implicações sobre a personalidade, o significado de ver ou não ver em um mundo saturado de imagens e também a importância das emoções como elemento transformador da realidade ­ se é que ela é a mesma para todos.






ELEFANTE - Um belo dia de outono, tão belo que não merecia ser ofuscado. Mas mesmo na tranqüilidade de um subúrbio em Portland (no estado norte-americano de Oregon), a latente agressividade humana se sobressai. Elefante, de Gus Van Sant, baseia-se no mesmo argumento que Tiros em Columbine de Michael Moore, o assassinato de 14 jovens e um professor em Columbine High School, em 1999, por dois estudantes. Contudo, esse filme mostra-se diferente da ótima película de Moore. A narrativa parte da perspectiva de alguns alunos, envolvidos de alguma forma na iminente tragédia. A obscuridade da mente confusa dos adolescentes ganha espaço e mostra do que é capaz. Sem apelar para a violência gratuita, ou o sensacionalismo Van Sant, consegue perpetuar na memória de cada espectador as impressões de uma tragédia que chocou e botou em xeque o “American way of life”.






Roma Cidade Aberta - Entre 1943 e 1944, Roma, sob a ocupação nazista, é declarada uma "cidade aberta", para evitar bombardeios aéreos. Nas ruas, comunistas e católicos deixam suas diferenças de lado para combater os alemães e as tropas fascistas.

Filmado logo após a libertação da Itália, em locações reais e com atores amadores, este filme tornou-se o marco inicial do neo-realismo italiano, que mostrou ao mundo que era possível se fazer cinema mesmo sob as mais precárias condições.




Deixe o seu comentario com o nome do filme que voce gostaria de ver até o dia 20/set.
Na semana seguinte se ele for o vencedor, é só preparar a pipoca e o chimarrão e curtir o seu filme.

Até mais cinéfilos!!!!!

domingo, 25 de maio de 2008

Cannes











Elenco de Entre Paredes

Confira a lista dos premiados no 61º Festival de Cannes, cujos resultados foram anunciados neste domingo (25):

Palma de Ouro: "Entre les murs" (Entre paredes), do francês Laurent Cantet

Grande Prêmio do Festival: "Gomorra", do italiano Matteo Garrone

Prêmio do Júri: "Il Divo", do italiano Paolo Sorrentino

Melhor Atriz: a brasileira Sandra Corveloni ("Linha de passe")

Melhor Ator: o porto-riquenho Benicio del Toro ("Che")

Melhor Diretor (mise en scène): o turco Nuri Bilge Ceylan ("Üç Maymun" / Três macacos)

Melhor Roteiro: os belgas Jean-Pierre et Luc Dardenne ("O silêncio de Lorna")
Palma de Ouro para Curta-metragem: "Megatron", do romeno Marian Crisan

Menção especial para Curta-metragem: "Jerrycan", de Julius Avery Câmera de Ouro: "Hunger", do inglês Steve McQueen

Menção especial: "Ils mourront tous sauf moi", da russa Valeria Gaï GuermanikaPrêmio especial do 61º Festival de Cannes: a atriz francesa Catherine Deneuve ("Un conte Noël") e o ator e diretor americano Clint Eastwood ("The exchange").

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Sexta-feira o nosso museu MALG (Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo) fez uma sessão de cinema GRÁTIS (com direito a pipoca e refrigerante) e três professores do curso de Cinema da UFPel, foram convidados para discutir sobre o filme, Saneamento Básico.
O filme do Jorge Furtado eu já tinha visto, mas achei legal a idéia de assistir filme em grupo e discuti-lo.
Como é todo em função de um curta, seria interessante que mais gente tivesse assistido, pois é o projeto que temos que fazer pro final de semestre. É uma verdadeira aula sobre como se escreve um roteiro e como se faz para produzi-lo.
Acho importante discutir o cinema brasileiro, hoje com uma baita qualidade, mas ainda pouco assistido e discutido. Me irrita saber que a população prefere filmes hollywoodianos aos nossos e a bilheteria comprova.
O filme se passa no Rio Grande do Sul, mas com atores globais com sotaque carioca (ponto negativo) e nenhumazinha música nacional (ponto negativo de novo).
Ainda sofremos com filmes legais e atores famosos, o que só existe porque a população não gosta do que não conhece. Por isso elencam celebridades que por si só já vendem o filme. Lázaro Ramos, Fernanda Torres, Wagner Moura, Camila Pitanga entre outros globais são parte do elenco .

Fora as críticas (algumas não citadas pra não parecer chata), o longa é divertido e discute ainda a política governamental de verbas para a cultura, e qual a importância (e relevância) de se produzir cinema ($) em um país “sem saneamento básico”.
O filme se passa numa cidadezinha do interior do Rio Grande do Sul e o exemplo de uma crítica é quando o (a) personagem do Lázaro Ramos fala "É bom saber que nós não precisamos ir pra Porto Alegre pra sermos reconhecidos".

Fica a dica de filme e a crítica, primeiro pra quem não valoriza trabalhos brasileiros (não só filmes) e também pros que não aproveitam projetos legais como esse do Museu e depois ficam por aí dizendo que "Pelotas é uma merda".


HELENA Schwonke.



El Baño del Papa


Trata-se de um evento religioso, claro, mas a população local vê aí a oportunidade de ganhar algum dinheiro ou mesmo (para outros) ficar rica. Assim, barracas serão montadas para se vender de tudo - mas sobretudo comida.


Um dos moradores, no entanto, tem outra idéia: construir um banheiro em frente a sua casa. Aquela multidão toda certamente vai precisar de banheiro durante a visita do Papa.Simples, sensível e com doses certas de drama e humor. E também comovente, sem deixar de fazer uma crítica social.


É irônico, no mínimo, que em sua visita o Papa fale justamente sobre trabalho numa região onde o que menos há é oportunidade de emprego.Uma produção bastante modesta, "El Baño del Papa" é realmente encantador. Mas é fruto de uma colabração importante para sua existência. A co-produção com o Brasil - assinada pela O2 de Fernando Meirelles, contando com César Charlone, que assina o roteiro e a direção em parceria com Enrique Fernández.


Marcos Petrucelli é editor do site e-Pipoca


Bem Pessoal essa critica foi tirada do site do festival de gramado e postada aqui para fazer referencia ao filme latino americano que esta dando o que falar.

Uma produçao uruguaia vem se destacando no cenario cinematografico Latino-americano e esse filme é " Banheiro do Papai"...... Bem dirigido, o filme conta com um elenco de atores amadores do Uruguai, boa pedida para vermos qualquer hora em aula.


Ps: Tenho a copia não autorizada e sem legendas direta de Montevideu. Se alguem quiser me procure nas aulas de cinema.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Roteiros

Abaixo estão tres modelos de roteiros.



HOUVE UMA VEZ DOIS VERÕES
TEXTO FINAL 05 de dezembro de 2001
produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
*******************************************************************
CHICO (OFF): Esta é a maior praia do mundo. Trezentos e cinqüentae três quilômetros, tá no livro dos recordes. Talvez seja tambéma pior praia do mundo, principalmente em março. Em janeiro efevereiro pode até ser divertido, mas em março é um saco. A gentetem que inventar coisas para fazer todo o tempo. Não é fácil.
CHICO (OFF): Quando eu tou louco para rir mas não posso, eu pensoem coisas muito tristes. Minha mãe reclamando da casa. Meu paitentando nos convencer que esta é a melhor praia do mundo. Meupai fazendo contas pra pagar nossas férias. Um filho que eu possoter um dia me olhando fazer contas pra pagar as férias dele. Eutentando convencer um filho que eu posso ter um dia que esta é amelhor praia do mundo. Quase sempre funciona. Quase sempre.
JUCA: Com licença?
MORENA: O que foi?
JUCA: A bolinha caiu.
MORENA: No pescoço.
JUCA: Ah. É... Desloquei a terceira vértebra cervical. Tavapegando uma onda, fui dar um drop. Meu parceiro tava no tubo. Mastudo bem. Vocês estão aqui?
MORENA: Tamos, né?
JUCA: Não, quer dizer, tão passando o verão aqui?
MORENA: Não, não. O meu namorado foi ali, colocar gasolina, agente vai pro Rosa.
CHICO: E aí?
JUCA: Namorado de carro, não dá para meter. Ainda mais comcachumba.
CHICO: Tu disse que estava com cachumba?
JUCA: Claro que não. Tou na fase de maior contágio. Se eu cuspirem ti, tu tá frito.
CHICO: Eu já tive cachumba. Todo mundo já teve cachumba.
JUCA: Quatro a três, hein?
CHICO: Cinco a três. Vamos pro outro?
JUCA: Não, vou dormir. O médico me disse que a cachumba podedescer pro saco. Já pensou? Eu, de sunga, na praia, caminhando deperna aberta.
CHICO: Não, não pensei.
MENINA: Eeei! Meu namorado.
NAMORADO: Ó!
JUCA: Ô, rapaz! E aí? Tudo bom?
JUCA: Isso aí. Boas ondas, hein?
JUCA: Tu já teve cachumba?
NAMORADO: Cachumba?
JUCA: É.
NAMORADO: Não.
JUCA: Ah, tá.
NAMORADO: Cachumba?
CHICO (OFF): O meu recorde nos patos é setenta e dois. O meuvice-recorde é cinqüenta e quatro. O dia dos setenta e dois patosfoi um acontecimento, eu tava em estado de graça. Eu tavaintegrado em alguma força cósmica, atirava nos patos antes deeles aparecerem. O anjo da guarda do flíper tava pousado no meuombro e dizia: lá vem um pato. No dia em que eu conheci a Roza oanjo da guarda do flíper não tava me dizendo nada sobre os patos.Sorte dos patos. E também sorte minha.
CHICO: É no outro buraco.
ROZA: Já tentei, não deu.
CHICO: É que tu apertou o botão errado. Põe de novo.
CHICO: Agora aperte o start.
ROZA: Qual?
CHICO: O amarelo que tá piscando, escrito "start".
ROZA: Hum.
ROZA: Deu! Obrigado.
ROZA: Deu. Valeu.
CHICO (OFF): O Juca sempre diz que existem quatro tipos degurias. O primeiro tipo é o que te transforma num idiota. Osoutros dois eu não lembro.
CRIANÇA: Bá, cara, tu é muito ruim, te larguei de mão.
ROZA: Uma ficha, por favor.
ROZA: Vou eu botar mais dinheiro fora.
CHICO: Quer churros?
ROZA: O quê?
CHICO: Tu quer comer um churros? Eu te pago.
ROZA: Ah, já comprei uma ficha.
CHICO: Depois a gente pode voltar.
ROZA: Tá legal.
CHICO: Meu nome é Chico. Francisco.
ROZA: O meu é Roza. Com zê.
CHICO: Por que com zê?
ROZA: Acho que o cara do cartório era meio analfabeto. Sódescobri que era com zê há três anos, daí eu achei legal. Com esse tem muitas. Com zê, só eu.
CHICO: O meu Chico é com xis e com quê.
ROZA: É?
CHICO: Mentira, é Chico mesmo. Tu quer doce de leite ou creme?
ROZA: Doce de leite.
CHICO: Dois com doce de leite.
ROZA: Nem sei por quê que existe com... com creme, doce de leiteé muito melhor.
CHICO: Ah, eu acho legal que tenha o de creme. É mais legal tucomer pensando "eu tou comendo o melhor" do que comer pensando"eu tou comendo o único que tinha para comer".
ROZA: É. Isso é. Obrigada.
CHICO: Tua casa é por aqui?
ROZA: Hum-hum. Lá não tem flíper. Vamos comer na praia?
ROZA: Por que tu tira férias em março?
CHICO: É mais barato.
ROZA: Tu tá perdendo aula...
CHICO: Não. Só uma semana. Nunca acontece muita coisa na primeirasemana. E tu?
ROZA: Eu gosto mais de praia em março. Tem menos gente.
CHICO: Tu vai à praia a que horas?
ROZA: De tarde. Eu sempre acordo na hora do almoço. Teve uns diasque eu nem fui, mas essa semana eu, eu vou aproveitar. Em janeiroe fevereiro tu fica em Porto Alegre?
CHICO: Fico. E tu?
ROZA: Às vezes eu viajo. Tu viu como as tatuíras brilham noescuro? São fluorescentes.
CHICO: Fosforescentes.
ROZA: Qual é a diferença?
CHICO: Fluorescente é de flúor, fosforescente é de fósforo. Umalâmpada é fluorescente, uma tatuíra é fosforescente.
ROZA: Tu tá com doce de leite no queixo.
CHICO: Tu tá cheia de açúcar.
ROZA: Tu vai fazer vestibular?
CHICO: Ano que vem.
ROZA: Hum. Pra quê?
CHICO: Eu não sei ainda. É Comunicação ou letras. Ou desenhoindustrial. Ah, se bem que computação eu gosto também.
ROZA: Eu fiz para arquitetura mas não passei. Aí este ano eu nemme inscrevi, eu tou guardando dinheiro, quero ir pra Austrália.
CHICO: Por que pra Austrália?
ROZA: Tenho uma amiga que foi para lá. E a Austrália é bom que ébem longe. Tu fica lá, na Austrália, aí todo mundo fica aquiachando que tu deve tá muito feliz.
CHICO: Tu fala inglês?
ROZA: More or less. E tu?
CHICO: So-so.
ROZA: Tu é virgem?
CHICO: Não. Quer dizer, sou mais ou menos.
ROZA: Como assim?
CHICO: É, acho que eu sou.
ROZA: Acha?
CHICO: É que eu tive umas histórias. Mas não foi nada assim...muito profundo.
ROZA: Hum... Sei. Quer deixar de ser?
CHICO: Quero, claro. (...) Tu quer dizer, agora?
ROZA: Vamos?
CHICO: Acho que sim.
ROZA: Acha?
CHICO: Claro que sim.
JUCA: Tu comeu?
CHICO: Comi.
JUCA: Mentira.
CHICO: Comi.
JUCA: Não acredito.
CHICO: Juro, cara.
JUCA: Jura por Deus?
CHICO: Juro.
JUCA: Pela alma da tua mãe?
CHICO: Juro.
JUCA: Pela bunda da Silmara?
CHICO: Eu comi, cara. Juro. É que, na verdade, foi ela que mecomeu.
JUCA: Será que ela dá para mim?
CHICO: Tá louco?
JUCA: Quê que tem? Vocês tão namorando?
CHICO: Não. Não sei. Não falei com ela ainda.
JUCA: Mas tu tá a fim?
CHICO: Ah, eu tou.
JUCA: Será que ela não tem uma amiga?
CHICO: Não sei.
JUCA: Deve ter. E a amiga deve dar também. Se uma dá, as outrastambém dão.
CHICO: Não sei por quê: eu já transei e tu não.
JUCA: Transou ontem. Se tu já tivesse transado há tempo, eutambém já tinha. É melhor que punheta?
CHICO: É totalmente diferente.
JUCA: Como assim?
CHICO: É, diferente.
JUCA: Diferente como?
CHICO: Muito melhor. É outra coisa.
JUCA: Não sei. Acho que vou morrer de vergonha de me acabar nafrente de alguém. Já me vi no espelho, eu fico ridículo. A guriavai me ver me acabando e vai ter um ataque de riso, tenhocerteza.
CHICO: Não vai, cara. É muito bom.
JUCA: Bom como?
CHICO: Ah, é muito melhor.
CHICO: Parece que tu tá... ficando explodindo e ficando inteiroao mesmo tempo. É quente, molhado.
JUCA: Continua.
CHICO: Ah, não enche o saco.
JUCA: Bá, vai ser hoje! Até vou botar a minha tala.
CHICO: Ainda precisa?
JUCA: Não, mas é bom pra puxar assunto. E eu aproveito pra trocarde camisa.
CHICO: Por quê?
JUCA: Não sei o que tá escrito nessa camisa. E se a guriapergunta o que tá escrito? Elas adoram perguntar essas coisas. Sea guria pergunta o que tá escrito na minha camisa e eu não sei,não dá para trepar.
CHICO: Quem é que vai trepar, Juca? A gente só vai procurar aRoza na praia, cara.
JUCA: Nunca se sabe. Vou botar a camisa branca. Ou então alistrada. Não, a listrada é meio gay. Vou botar a branca. Quemerda, por quê que eu não cortei esse meu cabelo ontem? Se eusoubesse que hoje eu ia trepar...
CHICO: Tu nem sabe se ela tem uma amiga. E se tiver, pode ser umtrubufu.
JUCA: Hoje eu como até gorda.
CHICO: Vamos voltar?
JUCA: Outra vez?
CHICO: Ela pode ter chegado agora.
JUCA: Vamos perguntar.
CHICO: Perguntar como?
JUCA: Se alguém conhece a Roza. Roza com zê.
CHICO: Pra todo mundo?
JUCA: Não. Só para as gurias. Deixa que eu pergunto.
JUCA: Oi. Tudo bem? Por acaso, tu não conhece uma menina chamadaRoza? Roza com zê. Ela tá numa casa por aqui.
VIOLETA: Conheço.
JUCA: Conhece?
VIOLETA: Conheço.
JUCA: Ela conhece.
CHICO: Ó.
VIOLETA: Oi.
CHICO: Tu sabe onde ela mora?
VIOLETA: Não, só encontro ela na praia.
CHICO: Não sabe de alguém que conhece ela?
VIOLETA: Acho que ela vem sempre sozinha.
JUCA: Meu nome é Juca. Esse aqui é o Chico.
VIOLETA: Oi.
JUCA: O teu nome é?
VIOLETA: Violeta.
JUCA: Posso te chamar de Vi?
VIOLETA: Não.
JUCA: Desculpa.
VIOLETA: Tudo bem.
CHICO: E tu... não viu ela hoje?
VIOLETA: Não.
CHICO: Tá legal, então. A gente vai dar mais uma procuradinha aí.
VIOLETA: Eu vou ir com vocês.
JUCA: Boa, vamos.
VIOLETA: Legal essa camisa.
JUCA: Ah, obrigado.
VIOLETA: O quê que está escrito?
JUCA: O amor é cego e os amantes não podem ver as bonitas foliasque eles mesmo cometem.
VIOLETA: Bonitas folias?
JUCA: É. É do Shakespeare.
VIOLETA: Faz tempo que tu não corta o cabelo?
JUCA: É, eu tava deixando. Mas eu vou cortar.
VIOLETA: Achei legal.
JUCA: Vou cortar um dia, né? Não sei quando. Talvez eu deixe.
CHICO: A Roza te falou onde mora em Porto Alegre?
VIOLETA: Não. E vocês? Moram onde?
CHICO: Tristeza.
JUCA: Floresta.
VIOLETA: Onde na Floresta?
JUCA: Perto da Cristóvão.
VIOLETA: Ãh, eu moro na Cristóvão.
JUCA: Tá brincando? Perto dos bombeiros?
VIOLETA: Não, um pouco mais para cima. Sabe o Hospital Militar?
JUCA: Sei.
CHICO: A Roza te falou se ia a algum lugar hoje?
VIOLETA: Olha, eu só vi a Roza uma vez. O quê que aconteceu noteu pescoço?
JUCA: Tu... já teve cachumba?
VIOLETA: Já. Tu tá com cachumba?
JUCA: Não, não, eu tou fazendo uma pesquisa. É que eu desloquei aterceira vértebra cervical. Eu tava pegando onda, fui dar umdrop, meu parceiro tava no tubo.
VIOLETA: Tu surfa?
JUCA: Surfo.
JUCA: Mas tudo bem. Tou pronto pra outra.
CHICO: Olha só, vou dar mais uma procurada, tá?
VIOLETA: Legal.
JUCA: Isso aí.
CHICO (OFF): Procurei a Roza todos os dias. Na praia e no flíper.Ela sumiu. O Juca passou três dias chamando a Violeta de Vi,Vivinha, Viviquinha, essas coisas. E não comeu.
JUCA: Essa é uma seleção dos melhores vinhos tintos de diferentessafras, elaborados com as uvas Cabernet Sauvignon...
VIOLETA: É, é?
JUCA: ... reunidos em um corte harmônico selecionado peloenólogo.
VIOLETA: Como é que tu sabe disso?
JUCA: Tá escrito aqui. Chico, preciso falar contigo.
JUCA: Tu tem que me ajudar. Ela tá sozinha em casa, a mãe sóvolta no fim-de-semana.
CHICO: Quer que eu segure ela pra ti?
JUCA: Tu tem que ir junto, com outra guria. A gente come umapizza aqui, depois vai para casa dela. Aí a gente joga carta,toma um vinho. O resto deixa comigo. Gravei uma fita só com asbaladas, não tem erro. Tu tem que ir junto, com outra guria.
CARMEM: Quer dar uma olhadinha?
JUCA: Não, não.
CARMEM: Mas é só o que vai se usar.
CHICO: Que guria?
JUCA: Qualquer uma. Convida alguém.
CHICO: Onde é que eu vou arrumar uma guria, Juca?
JUCA: Sei lá. Te vira, Chico. Pelo amor de deus.
CHICO: Eu não tenho grana, cara, tou duro.
JUCA: Eu pago o jantar e o vinho.
CHICO: Não. Eu não tou a fim de arrumar uma guria assim.
JUCA: Assim como, cara?
CHICO: Eu tenho que procurar a Roza.
JUCA: A Roza sumiu, Chico, deve ter voltado para Porto Alegre.
CHICO: Não, ela disse que ia aproveitar a última semana na praia.Ela deve tá em outra praia.
CARMEM: Com licença, querem dar uma olhadinha?
JUCA: Eu já disse que não.
CARMEM: Mas é do menino da novela das oito.
JUCA: Como é que tu vai procurar ela em outra praia se tu não temdinheiro nem pra jantar? Te dou cem reais.
CHICO: Cem reais? Tá louco?
JUCA: Cem reais. Olha aqui. Amanhã tu procura a Roza. Se tu nãofor, eu quero o meu dinheiro de volta.
CHICO: Tá, tá.
CARMEM: Ôi, não quer dar uma olhadinha?
MOÇA NO BAR: Não, obrigada.
CARMEM: Olha, mas tem tanta coisa aqui.
MOÇA NO BAR: Não, obrigada, eu tenho que... tá bom? Tchau.
CARMEN: ... Tá super na moda, é só o que vai se usar.
CHICO: Oi.
CARMEM: Oi.
CHICO: Tá sozinha?
CARMEM: Por quê?
CHICO: É que eu tou. Quer jantar comigo hoje?
CARMEM: Não, obrigada.
CHICO: Olha só. Tá a fim de ganhar cinqüenta reais?
CARMEM: A troco?
CHICO: É que o meu amigo tem uma namorada. Hoje à noite elescomer uma pizza, tomar um vinho e jogar uma carta. Ele me deu cemreais e quer que eu leve uma guria. Te dou cinqüenta para tu ircomigo.
CARMEM: Cinqüenta reais para comer pizza e tomar vinho?
CHICO: É.
CARMEM: Até que horas?
CHICO: Ah, meia-noite, no máximo.
CARMEM: Sabe o quê que é isso aqui?
CHICO: Não. O quê que é?
CARMEM: Spray repelente para urso.
CARMEM: É feito de pimenta. Se eu jogar isso na tua cara, tu ficasem enxergar uns dois dias.
CHICO: Tá, é só pra comer pizza e tomar vinho. Não te preocupa.
CARMEM: E quem é que vai pagar a conta aqui?
CHICO: Ah, o meu amigo ali paga.
CARMEM: Cadê o dinheiro?
JUCA: Vocês sabem jogar dorminhoco?
CARMEM: Dorminhoco? Não. Sei jogar pôquer, escova, buraco.
VIOLETA: Ah, é fácil. São dezessete cartas: às, rei, dama evalete, quatro naipes.
JUCA: E um coringa.
VIOLETA: E um coringa.
JUCA: Quatro cartas pra cada um e um recebe cinco.
VIOLETA: Tem que formar os quartetos. Vai passando uma carta porvez.
JUCA: Quem pega o coringa não pode passar de primeira, tem queficar uma rodada.
VIOLETA: É fácil.
CHICO: É fácil.
JUCA: Quem formar primeiro baixa as cartas. O último a baixar é odorminhoco.
VIOLETA: Queima a rolha pra marcar.
CARMEM: Rolha? Que rolha? Tu não falou em rolha.
VIOLETA: A gente queima uma rolha e marca o dorminhoco de preto.Sai com água.
CHICO: Sai com água.
JUCA: Melhor! Vamos fazer assim, ó: quem perder tem que tirar umapeça de roupa.
VIOLETA: Isso! Melhor que rolha!
JUCA: Combinado?
CARMEM: Tudo bem. É melhor que rolha.
JUCA: Ótimo!
VIOLETA: Corta.
CHICO (OFF): Se eu tivesse acertado nos patos, não precisaria decinqüenta reais pra procurar a Roza. Com cinqüenta reais dá paracomer quatro dias, dormindo na barraca. Eu posso ir de ônibus evoltar de carona, parando em cada praia. Ela diz que vai à praiade tarde, eu viajo de manhã e procuro na praia de tarde.
JUCA: Violeta!
VIOLETA: Hã?
JUCA: A saia!
VIOLETA: Tudo bem. Eu ainda tenho as meias.
JUCA: Duas?
VIOLETA: Não, é meia-calça.
JUCA: Deixa que eu tiro. Eu acho que ela não tá bem.
CARMEM: Deixa eu ver. (...) Meia-noite, acabou o jogo. Obrigadapela janta. Deixa ela dormir.
CHICO: Eu vou contigo.
CARMEM: Tu não é colega do Gustavo?
JUCA: Que Gustavo?
CARMEM: Da Praça da Matriz.
JUCA: O Cabeça? Sou. Por quê?
CARMEM: Sabia que eu te conhecia. Eu sou prima do Gustavo.
JUCA: Prima? Do Cabeça?
CARMEM: É, prima.
JUCA: Olha só! Legal.
CHICO: Eu vou levar ela pra cama.
JUCA: E o Cabeça vai bem?
CARMEM: Não sei. Faz tempo que eu não vejo.
JUCA: Pois é.
CARMEM: Bom, a gente se vê por aí. Obrigado pela pizza. E pelovinho.
JUCA: Ainda é cedo.
CARMEM: O combinado foi meia-noite.
JUCA: Que combinado?
CARMEM: Ele me pagou cinqüenta reais pra eu ficar até a meia-noite.
JUCA: Ah, é?
CARMEM: É.
JUCA: E... quanto tu quer pra ficar mais um pouco?
CARMEM: Se for para jogar esta bobagem, quinhentos. Agora, se tuquiser fazer alguma coisa mais interessante...
CARMEM: Cento e cinqüenta.
VIOLETA: Chico?
CHICO: Oi?
VIOLETA: Chico, eu acho que eu bebi demais.
CHICO: Eu também acho, Violeta. A gente já tá indo embora.
VIOLETA: Pede desculpas pra eles. Diz que eu acho que bebidemais.
CHICO: Tá bom, Violeta. Dorme.
JUCA: Chico!
JUCA: Cadê aquele dinheiro que eu te dei?
CHICO: Por quê?
JUCA: Me empresta.
CHICO: Pra quê?
JUCA: Pra dar pra Carmem. Fim de semana meu pai chega e eu tepago.
CHICO: Não. Eu vou precisar do dinheiro amanhã.
JUCA: Chico, tu não tinha dinheiro nenhum. Esse dinheiro eu tedei para tu me fazer um favor que tu deveria fazer de graça. Eupreciso do dinheiro agora. Tu não vai me emprestar?
CHICO: Pega o dinheiro.
JUCA: Fica aí.
JUCA: O resto eu... te dou depois.
CARMEM: O resto eu te dou depois.
CHICO: Ela já foi?
JUCA: Já.
CHICO: E o dinheiro?
JUCA: Eu gastei.
CHICO (OFF): Eu podia descobrir as impressões digitais dela naficha, se eu já não tivesse segurado e esfregado esta ficha milvezes. E se não tivesse que estudar para a prova de químicaorgânica.
CHICO (OFF): Ligações covalentes. Pra quê que eu vou usar isso navida? Talvez ela já esteja na Austrália.
CHICO: Alô? (...) É. (...) Claro. (...) Tudo. (...) Como é que tuconseguiu meu telefone? (...) Sei. (...) Não, tava estudando.(...) É, química orgânica. (...) Quero, claro. (...) Sei. (...)Que horas? (...) Tá legal. (...) Tá. (...) Outro.
CHICO: (berro) Ia-ha-ha-háááááá!
CHICO: Ela disse alô, eu disse alô, já achando que era ela, masnão podia ser ela. Ela falou é o Chico? e eu disse é, aí jáachando que era ela mesmo. Ela falou é a Roza, com z, lembra? Eudisse, claro. Aí ela disse que queria me ligar mas que não tinhao meu telefone. Aí eu perguntei como é que ela tinha conseguido.Ela falou que tinha sido com uma amiga minha lá da praia quetinha, que deve ser a Violeta.
JUCA: É.
CHICO: É, pois é, aí eu disse sei. Ela perguntou se tavainterrompendo alguma coisa, eu falei que não, imagina, que euestava estudando química orgânica. Aí ela perguntou se eu queriaencontrar com ela, eu falei que sim, claro, lógico. Não, não,acho que só falei quero, claro. Aí ela perguntou se eu sabia dumbar na Nilópolis, um que tem umas mesinhas na calçada, perto doposto.
JUCA: O Coquinho.
CHICO: É, o Coquinho. Aí eu disse sei e perguntei que horas. Elafalou umas oito, oito e meia. Eu disse tá, tudo bem, pra mim táótimo, a gente se vê por lá. Ela disse um beijo. Eu disse outro.
JUCA: Vai com a azul. No Coquinho só tem moinhos, a azul é maismoinhos. Tu tem camisinha?
CHICO: A gente não vai trepar no Coquinho.
JUCA: Leva camisinha.
CHICO: Uma só?
JUCA: Ué? Não ia trepar e agora quer duas?
CHICO: Tá, tudo bem, uma só chega. A gente não vai trepar noCoquinho, né?
JUCA: Tu já sabe o que tu vai dizer?
CHICO: Eu pensei muito naquela noite. Claro que eu nunca vouesquecer, tu sabe disso. Talvez tenha sido mais importante pramim do que pra ti, né? Deve ter sido. Mas eu queria que fosseimportante pra ti também. Queria não, eu quero. E eu não queroque aquela seja nossa única noite. Quero que seja a primeira.JUCA: Tá legal. Esse "queria não, quero", parece que tu errou ecorrigiu na hora. Ficou bom. Mas a camiseta azul é muito melhor.
ROZA: Oi.
CHICO: Oi.
CHICO: Que bom te ver.
ROZA: Também queria te ver.
CHICO: É?
ROZA: Hum, hum.
CHICO: Pô, legal. Eu pensei muito naquela noite.
ROZA: Eu não pensei nada, acho que eu tava louca. A gente nemusou camisinha.
CHICO: Não, eu pensei muito sobre aquela noite. Eu nunca vouesquecer, tu sabe disso, né?
ROZA: Eu também nunca vou esquecer.
ROZA: Eu tou grávida.
ROZA: Se der vermelho ou cor de rosa é porque tu não tá. Se derazul ou verde é porque tu tá. Quanto mais azul, mais certo que tutá grávida.
CHICO: É, tá meio verde mesmo, né?
ROZA: Essa foi a primeira que eu fiz, semana passada. Esta eu fizontem.
CHICO: E tu fez mais de uma vez?
ROZA: Vou tirar.
CHICO: Como?
ROZA: Vou abortar.
CHICO: Mas como?
ROZA: Numa clínica que uma amiga minha conhece. Diz que é umlugar super chique, cheio de gente. Fica lá na Zona Zul.
CHICO: Não é perigoso?
ROZA: Sempre é, um pouco, né?
ROZA: Mas, se eu fizer logo, acho que nao dá nada.
CHICO: Como é que faz?
ROZA: É uma máquina, um tubo, tipo um aspirador. O cara enfia otubo, liga a máquina e... E pronto.
CHICO: Pode ser perigoso.
ROZA: Acho que, quanto mais cedo, menos perigoso.
CHICO: E eu posso te ajudar?
ROZA: Não sei. Tu tem mil reais?
CHICO: Mil reais? Custa mil reais?
ROZA: Na verdade, custa dois mil reais. Mas eu, eu possoconseguir mil, eu tenho seiscentos. Se tu não tiver, Chico, olha,não, não tem problema.
CHICO: Mil reais?
ROZA: Mil reais. Eu posso conseguir mais um pouco se vender o meucelular.
CHICO: Tu tem celular?
ROZA: Tenho, mas é de cartão. Me liga. Se eu conseguir mais quemil, eu te, eu te aviso. Se tu me ligar e outra pessoa atender éporque eu já vendi o meu celular.
CHICO Ro- za!
CHICO: Ia ser legal ter um filho contigo.
ROZA: Quem sabe, mais tarde.
CHICO: Quem sabe.
CHICO (OFF): O filho que eu não vou ter com Roza nunca vai mentirpra mãe que o amplificador estragou para poder vender porseiscentos um amplificador que vale mil e juntar com o dinheiroda poupança para pagar um aborto.
CHICO: Tá faltando duzentos. Eu vou pedir pro Juca, talvez eletenha, tá?
ROZA: Não. Não fala nada pra ninguém. Eu consigo o resto.
CHICO: Tu quer que eu vá contigo?
ROZA: Uma minha amiga vai, ela... ela vai me levar de carro.
CHICO: Quando é que tu vai ir?
ROZA: Assim que der. Acho que amanhã.
CHICO: Se tu quiser, tu pode me ligar, tá?
ROZA: Tá.
CHICO: Alô, Roza? Tu tá com a Roza? Ah, é? Quando? Ah... E tuconhece a Roza de onde? Ah, é? Não, ela falou que ia vender ocelular, mas é que eu não achei que fosse ser tão rápido. E elanão deixou nenhum número, alguma coisa? Tá bom. Bom, se elaligar, tu pode... dar um recado pra mim? Tudo bem, eu sei que elanão vai ligar, mas se ela ligar, tu pode dizer que o Chicotelefonou? Tá legal, então. Obrigado, hein?
JUCA: Quem disse que o filho era teu?
CHICO: Não enche o saco, Juca.
JUCA: Falando sério. Quem disse que o filho era teu?
CHICO: Eu sei que era meu. Ela sabia.
JUCA: Sabia que precisava de mil reais, isso é que ela sabia.Deve ter pedido pro outro cara, ele não deu, ela te procurou.
CHICO: Era meu. Eu sei que era.
JUCA: Ela vendeu o celular.
CHICO: Ela disse que ia vender.
JUCA: Não te ligou, não te deu endereço... Tu não acha estranho?
CHICO (OFF): Eu achei estranho. Passou uma semana e eu acheimuito estranho. Passou um mês e eu tive certeza que ela estava naAustrália, rindo da cara do idiota que pagou o aborto para ela.Passou um ano e eu estava no mesmo flíper, jogando na mesmamáquina, na mesma praia, a maior e pior do mundo. Felizmente eradezembro, o meu pai juntou uma grana este ano. Prometeu que noano que vem nós vamos tirar férias em janeiro. Meu recorde nopimbal era quarenta e oito mil e eu já tava com cinqüenta e seis.Sessenta! Sessenta e dois mil. Sessenta e quatro!
CHICO: Setenta mil!
JUCA: Setenta mil?
CHICO: Setenta e dois!
CHICO: Merda!
JUCA: Recorde da máquina!
CHICO: Ela sabia jogar. Sabia jogar muito bem. Ela fingiu que nãosabia para eu ajudar.
JUCA: Talvez o filho fosse teu.
CHICO: Que filho? Ela nem tava grávida.
VENDEDOR: O próximo!
CHICO: Noiva do Mar. Só de ida.
JUCA: Tu disse que viu o exame.
CHICO: Vi umas tirinhas de papel, podia ser qualquer coisa. Elafez eu vender meu amplificador, cara. Eu vou matar essa guria.
JUCA: Esquece.
CHICO: Esquece o cacete.
CHICO: Ela deve estar em outra praia, procurando uns idiotas quenem eu.
JUCA: Ela pode estar na Austrália.
CHICO: Eu encontro.
CHICO: Carmem!
CHICO: Oi.
CRIANÇA: Ah, não atrapalha!
CHICO: Eu te conheço.
CRIANÇA: Sorte tua.
CHICO: A gente não se viu no verão passado?
CRIANÇA: Putz, game over! Tu me atrapalhou, cara, me fez perder aficha!
CHICO: Eu tenho uma ficha.
CRIANÇA: Agora não adianta mais.
CHICO: Não, eu vou te comprar uma ficha.
CHICO: Pode me dar uma fichinha, por favor?
ROZA: Ó.
CHICO: Ôi.
ROZA: Vai querer os juros da poupança?
CHICO: Quero. Quanto é que dá?
ROZA: Tu me deu oitocentos, já faz um ano, acho que deve dar unsmil.
CHICO: Tá bom.
CHICO: Essa ficha aqui é tua, te lembra?
ROZA: Hum, hum. Pode deixar ali.
CHICO: Esse cheque aí tem fundo?
ROZA: Quer que eu coloque o telefone atrás?
CHICO: Quero.
CHICO: Outro celular. Esse aqui é teu mesmo, né?
ROZA: Quer conferir?
CHICO: Quero.
ROZA: Quer que eu atenda?
CHICO: O quê que tu ganhou com isso?
ROZA: Verão passado? Catorze mil reais. Vinte e dois caras,quinze caíram, tou devolvendo mil: catorze mil.
CHICO: Vinte e dois caras?
ROZA: Vinte e três, na verdade. Mas um eu deixei pra lá,trabalhava de office-boy, ajudava a mãe e o irmão... Sabe como éque é, né?
ROZA: Olha, Chico, eu preciso dormir.
CHICO: Tu não ficou com medo de engravidar de verdade?
ROZA: Eu tomo pílula.
CHICO: E a aids? Se o cara usa camisinha, não funciona.
ROZA: É, eu sei. Mas eu só pego caras de pouca experiência. Ounenhuma, como tu.
CHICO: Dava para ver assim, de longe?
ROZA: Quase sempre dá. Mais alguma coisa?
CHICO: Ele é teu filho?
ROZA: Meu irmão.
CHICO: E a tua mãe?
ROZA: Não sei onde anda.
CHICO: Teu pai?
ROZA: Morreu.
CHICO: Não tem mais ninguém?
ROZA: Onde?
CHICO: Tua família.
ROZA: Ah, eu tenho um tio. Um idiota, casado com uma imbecil.
CHICO: Por que tu não cobra para transar? É mais prático.
ROZA: E tu acha que alguém ia pagar mil reais para transarcomigo?
CHICO: Oi. A Roza tá aí?
INÁCIO: Tu conhece ela?
CHICO: Conheço.
INÁCIO: Sabe onde ela mora?
CHICO: Aqui na praia, sei que é num hotel. Por quê?
INÁCIO: Não mora mais.
CHICO: Eu tive lá ontem.
INÁCIO: Se mandou. Hoje. Tive lá, procurei pelo quarto... Saiusem pagar a conta.
INÁCIO: Tu não sabe um outro telefone ou endereço dela que eupossa entrar em contato, não?
CHICO: Não. Acho que ela mora em Porto Alegre. Mas ela deve terdeixado o endereço no hotel.
INÁCIO: Mas deve ser falso, né?
INÁCIO: O telefone que ela me deu é de uma gráfica.
INÁCIO: Ela te deu cano também?
CHICO: É, deu.
INÁCIO: Quanto?
CHICO: Mil reais.
INÁCIO: Vagabunda. Daqui do caixa ela me tirou uns seiscentos ecinqüenta pau. Mais uns duzentos que eu emprestei. E ainda melevou um tevê portátil. Se tu encontrar com ela, dá um recado queeu mandei. Tu diz que ela é uma vagabunda. É isso aí: diz que oInácio mandou dizer que ela é uma vagabunda.
CHICO: Tá eu digo.
JUCA (OFF): Faltavam dois números?
CHICO (OFF): Dois números. Os últimos. Eu não consegui lembrar.
JUCA (OFF): Noventa e nove possibilidades.
CHICO (OFF): Cem.
JUCA (OFF): Cem?
CHICO (OFF): Claro. O zero-zero também conta.
JUCA (OFF): Cem. Tu ligou pra cem celulares?
CHICO (OFF): Quarenta e oito. Eu tive sorte.
JUCA (OFF): E o que foi que ela disse?
CHICO (OFF): Ela disse alô.
ROZA: Alô?
JUCA: Chico, eu acho que eu não conheço ninguém mais idiota doque tu. Tu gastou uns cinqüenta reais em telefone pra achar umaguria que roubou teu amplificador e ainda cobra mil reais pratransar!
JUCA: A prima do Cabeça cobra cento e cinqüenta!
CHICO: Acontece que eu não tou a fim da prima do Cabeça.
JUCA: Vai dizer que tu tá a fim dessa guria?
CHICO: Não sei. É diferente.
JUCA: Pode ser diferente. Mas não pode ser oitocentos e cinqüentareais de diferença.
JUCA: Tu pagou mil reais por uma trepada.
CHICO: Quinhentos. Mil por duas.
JUCA: Mesmo assim. Trezentos e cinqüenta reais mais caro do que aprima do Cabeça. O quê que ela faz?
CHICO: Como assim?
JUCA: O quê que ela faz por quinhentos reais?
CHICO: Não enche o saco, Juca.
JUCA: Sabe o quê que a prima do Cabeça faz por cento e cinqüenta?
CHICO: Sei, tu já me contou mil vezes.
JUCA: Tu acha que ela vem?
CHICO: Acho que vem.
JUCA: Será que ela não tem uma amiga mais em conta?
CHICO: Pode ser. Pergunta para ela.
ROZA: Ó.
CHICO: Ó.
JUCA: Oi.
CHICO: Esse aqui que é o Juca.
ROZA: Oi.
JUCA: Posso te fazer uma pergunta?
ROZA: O quê?
JUCA: Tu aceita vale-refeição?
ROZA: Gracinha...
JUCA: De repente, te ligo.
ROZA: Isso. Vai juntando a tua mesada e me liga no ano que vem.
ROZA: O quê que tu quer?
CHICO: Queria te ver.
ROZA: Já viu. O que mais?
CHICO: O quê que foi?
ROZA: Eu não posso demorar, meu irmão tá em casa sozinho.
CHICO: Eu te levo.
ROZA: Tá de carro?
CHICO: Te levo de táxi.
ROZA: Não dá, depois como é que tu vai voltar? Eu moro longe,moro na zona sul.
CHICO: Eu volto de ônibus.
CHICO: Vamos.
CHICO: Tu tá trabalhando aonde agora?
ROZA: Numa loja.
CHICO: E o dinheiro?
ROZA: Que dinheiro?
CHICO: O dinheiro que tu tem guardado? Por quê que tu não usa?
ROZA: Não posso, eu tenho que guardar.
CHICO: Pra ir pra Austrália, né?
ROZA: Hum-hum, pra ir pra Austrália. O senhor pode ir semprereto, tá bom?
CHICO: Quanto é que custa duas passagens pra Austrália?
ROZA: Por que duas?
CHICO: Tem o teu irmão, né?
ROZA: Mas não vou levar o meu irmão pra Austrália.
CHICO: Com quem é que ele vai ficar?
ROZA: Com o meu tio.
CHICO: Tu disse que o teu tio era um idiota, casado com umaimbecil.
ROZA: Disse. Ele é um idiota casado com uma imbecil. Mas também,eu vou fazer o quê? Nem sei se eu tou a fim de ir pra Austrália.
ROZA: Ele vai continuar.
CHICO: Não, eu vou pegar um ônibus.
ROZA: Chico, só tem ônibus lá embaixo, vai de táxi que eu pagoaté aqui.
CHICO: Eu caminho até lá embaixo. Quanto é que foi, moço?
ROZA: É melhor tu não subir, o meu irmão tá em casa.
CHICO: A gente não faz barulho, Roza.
ROZA: Escuta. Eu gosto muito de ti, tu é um cara muito legal. Masvai embora.
CHICO: Eu não quero ir embora, Roza.
ROZA: Olha, esquece, já foi, entendeu? Eu não quero complicar tuavida.
CHICO: Eu não tou a fim de esquecer. E complicar minha vida porquê?
ROZA: Chico... Eu estou grávida.
MOTORISTA: Tá, e aí?
CHICO: Eu vou ficar.
MOTORISTA: Deu seis, três meia. Sete pilas.
CHICO: Tu acha que pode ser meu?
ROZA: Chico, por favor. Acho que não.
CHICO: Acha ou não?
ROZA: Não sei, não importa. Eu não tou te pedindo nada.
CHICO: Não sabe? E se for?
ROZA: Se for, é meu. Eu não quero nada, entendeu?
CHICO: Tu vai tirar?
ROZA: Não. Não sei. Olha, é melhor tu ir embora.
CHICO: Eu não quero ir embora. E eu não sei se quero que tu tiretambém. Tu tem dinheiro guardado.
ROZA: Que dinheiro, uma merreca.
CHICO: Ah, eu posso trabalhar.
ROZA: Não viaja, Chico.
CHICO: Tou falando sério.
ROZA: Não, tu não tá, tu tá viajando. Tu quer trabalhar, tu quercasar e criar dois filhos que não são teus?
CHICO: Um pode ser meu.
ROZA: Pode não ser...
CHICO: Ah, não interessa isso aí. E eu não quero ir embora. Ô,Roza, tu sabe que eu gosto de ti. Eu gosto um monte de ti.
ROZA: Eu também gosto de ti.
CHICO: Pois então?
ROZA: Pois então o quê, Chico?
CHICO: Eu gosto de ti, tu gosta de mim. Por quê que eu tenho queir embora? Tá esperando alguém?
ROZA: Não.
CHICO (OFF): Se eu tivesse batido o recorde no tiro ao pato nodia em que eu conheci a Roza, talvez eu não tivesse conhecido aRoza e a gente não teria um filho. Eu posso ter um filho por tererrado num pato. Eu não sei o quê que isso significa, mas devesignificar alguma coisa.
ROZA (OFF): Chico, acorda! Tu tem que sair daí agora! O dono doapartamento tá subindo. Chico!
CHICO: Alô.
ROZA: Chico, sai daí agora!
CHICO: Tu tá tomando pílula?
ROZA: Quê? Chico, tu tem que sair daí agora.
CHICO: Responde. Tu tá tomando pílula? Pílula anticoncepcional?
ROZA: E aí? Pega a minha bolsa e sai correndo daí.
CHICO: Tu tomou uma hoje de manhã, quarta. Por que tu tá tomandopílula? Tu tá grávida.
CHICO: Tu não tá grávida?
ROZA: Pode ser. Pára com essa conversa e me escuta. Pega a minhabolsa e sai correndo daí agora.
CHICO: Como, pode ser? Tá ou não tá?
ROZA: A-a-acho que não tou.
CHICO: Não tá ou pode ser?
ROZA: Não tou. Me escuta...
CHICO: Não tá?
ROZA: Eu descobri que eu não estava, agora de manhã.
CHICO: Ah, e já tá tomando pílula?
ROZA: É... Não, não. Não!
CHICO: Roza, fala a verdade. Uma vez na vida.
ROZA: Eu menti, eu menti que eu tava grávida. Eu não quero maismentir pra ti, mas ontem eu menti. Eu não tou grávida. (...) Nãotou porque eu não tou.
CHICO: Por quê que tu mentiu?
ROZA: Eu queria que tu fosse embora, Chico. Agora cala a boca eme escuta! Essa casa não é minha, é emprestada, eu tou aqui nafrente... O dono vai começar a subir... Ele tá entrando noprédio, pelo amor de Deus! Pega a minha bolsa e sai correndo daíagora!
CHICO: Tu é louca, Roza? Tu não tinha outro jeito de me mandarembora? Tu tinha que dizer que tava grávida e que o filho podiaser meu?
ROZA: Eu disse para tu ir embora, mas tu não foi. E eu disse queo filho não era teu.
CHICO: Disse que achava que não era.
ROZA: Pois então?
CHICO: Se achava que não era, podia ser.
ROZA: Não interessa, eu não tou grávida. O Inácio vai te pegaraí, tu não tá entendendo? Pega a minha bolsa e sai daí agora!
CHICO: Tu é louca, Roza.
Tu acha que tu pode fazer isso com as pessoas? Tu acha que tupode dizer que elas vão ter um filho, depois dizer que não,depois dizer que sim e dizer que não outra vez?
ROZA: Olha, Chico... Eu gosto de ti, eu, eu gosto muito de ti. Eunão quero mais te mentir. Mas sai daí agora, o dono doapartamento tá entrando, ele não sabia que eu estava usando oapartamento, nem sabe que eu tenho a chave. Ele vai te matar.
CHICO: O leite.
ROZA: Chico, eu te amo.
CHICO: Vai te fuder!
MULHER: Ô, Inácio!
INÁCIO: Quê que é?
MULHER: Como é que eu faço pra ligar essa tevê?
INÁCIO: Aperta no power.
MULHER: Eu tou apertando, e não tá acontecendo nada. Vem aqui.
INÁCIO: Dá aqui.
MULHER: Olha aqui.
INÁCIO: Ué?
MULHER: Viu?
INÁCIO: Deve ser pilha.
MULHER: Tu não tem pilha nova?
INÁCIO: Tem na cozinha, lá no armário. Pega.
MULHER (OFF): Tu deixou leite no fogão?
INÁCIO (OFF): Leite? É, pode ser.
MULHER (OFF): Ai!
INÁCIO (OFF): Que foi?
MULHER (OFF): Tá quente.
INÁCIO (OFF): Ué?
MULHER: Tem alguém aí?
INÁCIO (OFF): Claro que não, né?
MULHER: Mas alguém saiu daqui faz pouco.
INÁCIO: Estranho...
MULHER: Quem mais tem a chave?
INÁCIO: A minha mãe. Minha mãe nunca vem aqui, só se ela veiolimpar.
MULHER: De quem é esse celular, Inácio?
INÁCIO: Deixa eu ver. Ué, é meu. Onde é que tava?
MULHER: Tava bem aqui. Tu não disse que tinha perdido?
INÁCIO: Tinha, tu sabe. Eu procurei pela casa toda. Mas queestranho isso, hein?
MULHER: É... É muito estranho. Eu te liguei várias vezes, tu nãoatendeu e depois me disse que tinha perdido o celular. E ele tavabem aqui.
INÁCIO: Tá, não sei. Não sei, pronto. Será que eu deixei com aminha mãe? Não sei! (...) Quer tomar alguma coisa?
MULHER: Um banho.
INÁCIO: Vem aqui.
MULHER: Ai, não, Inácio, eu tou suada. Ai!
MULHER: Eu tou suada.
INÁCIO: Deixa assim, assim é melhor.
MULHER: Ai, Inácio, ãi, Inácio, ai! Ai, Inácio, aaaah! Ah, ai,ui, Inácio!
MULHER: Ah, Inácio... Ai, ui.
MULHER: Ai, Inácio, ai, ah! Ah... Que é isso, Inácio?
INÁCIO: Isso o quê?
MULHER: Esse sutiã! De quem é esse sutiã, Inácio?
INÁCIO: Não é teu?
MULHER (OFF): É claro que não! Vai dizer que é da tua mãe?
INÁCIO: Não, quer dizer: não sei.
MULHER (OFF): Tem uma mulher dormindo aqui?
INÁCIO (OFF): Claro que não. Imagina.
MULHER (OFF): Leite quente no fogão! O celular, que tu disse quetu tinha perdido! Um sutiã na cama...
INÁCIO (OFF): Mas eu não sei. Amor, eu não sei mesmo. Vem cá!
INÁCIO: Tá, talvez eu tenha esquecido o telefone lá na minha mãe.Talvez ela veio aqui, limpar o apartamento, esquentou o leite.Talvez até ela tenha dormido aqui.
MULHER (OFF): Sei. E a tua mãe usa aquele sutiã.
INÁCIO: Pode ser de uma amiga.
MULHER (OFF): Ah, claro! Tua mãe é sapata, por acaso? Ô, Inácio,quer fazer o favor de fechar a porta, hein? Tá frio.
MÃE: Sou eu, meu filho. Me liga quando chegar.
ROZA: Alô. Inácio, sou eu, a Roza, com Z. Lembrou? Da praia. Alô?Alô... Inácio, sou eu de novo, a Roza, da praia. Oi? Querodevolver a televisão. Tu esqueceu o teu celular comigo, eu querodevolver também. Alô?
MÃE: Sou eu, meu filho. Tu já voltou? Me liga quando chegar.
ROZA (OFF): Chico, acorda! Tu tem que sair daí agora! O dono doapartamento tá subindo. Chico!
MULHER: O que é isso, Inácio?
INÁCIO: É... U... uma barata.
MULHER: Ah... Tu vai matar a barata com a faca do pão, né?
INÁCIO: Não, eu tava só olhando.
MULHER: Ã-hã. Sei.
CHICO: Bom dia.
MULHER: Aaaaah! Aaaaaaah! Inácio!!!
MULHER: Cadê a chave, Inácio?
INÁCIO: Tá lá dentro.
MULHER: Ai, olha aqui como é que eu tou!
MULHER: Ôoooi!
TRÊS GURIAS: Aaaaahhh!
JUCA (OFF): Quando foi isso?
CHICO (OFF): Faz mais de um mês.
JUCA: Ela disse "eu te amo"?
CHICO: Disse.
JUCA: E tu disse "vai te fuder".
CHICO: Disse.
JUCA: Legal. Tu não é tão idiota como eu pensava.
CHICO: Não. Sou mais idiota. Sabe o quê que eu devia ter dito naverdade, né?
JUCA: O quê?
CHICO: Eu também te amo.
JUCA: Pode trazer a nossa continha, por favor.
JUCA: E ela te ligou a troco de quê?
CHICO: Diz que quer conversar. E quer a bolsa dela.
JUCA: Tem dinheiro na bolsa?
CHICO: Tem um pouco.
JUCA: Então ela vem.
JUCA: Pelo menos dois sucos ela vai nos pagar.
JUCA: Pode ficar com o troco.
JUCA: Chico, essa guria tem um irmão para criar, dá para qualquerum por quinhentos reais, roubou o teu amplificador e fica grávidatoda quarta-feira.
CHICO: Tá, eu sei. Mas te juro que, se ela disser que me ama, eucaso com ela.
JUCA: Por quê?
CHICO: Ela guardou a ficha do flíper.
CHICO: Oi.
ROZA: Oi.
CHICO: Esse é o Juca.
ROZA: Hum. Eu sei.
JUCA: Já sei. Tu tá grávida!
CHICO: Juca! Não enche o saco!
JUCA: Olha só, eu vou ao banheiro rapidinho. Se ela ficar grávidanesse meio tempo, vocês não avisem nada pro garçom, viu? Que aconsumação é cinco por pessoa, e ele pode querer cobrar dacriança.
ROZA: Chico...
CHICO: Desculpa.
ROZA: Desculpa por quê?
CHICO: Ah, por aquele dia. Eu fiquei louco, desculpa. É que umahora eu ia ter um filho, meia hora depois não ia ter mais, né? Aíeu fiquei louco. É estranho, mas eu tava achando legal ter umfilho. Mesmo que isso fosse... bagunçar completamente a minhavida, eu... tava achando legal ter um filho.
ROZA: Chico...
CHICO: Desculpa.
ROZA: Eu estou grávida.
CHICO (OFF): É, desta vez era verdade. Eu errei nos patos econheci a Roza. O laboratório vendeu pílulas de farinha e a Rozaficou grávida. A gente processou o laboratório e eles vão pagaruma mesada pra Jasmim até ela completar dezoito anos. Eu acho queaté lá eu arrumo um emprego.
HOMEM: Ai, ai, ai!
CHICO: O que aconteceu?
HOMEM: Quem é que faz uma coisa dessas?
CHICO (OFF): Não é muito dinheiro, mas deu pra alugar umapartamento, pagar a creche, as fraldas. E deu pra alugar umacasa, em janeiro, na maior praia do mundo.
HOMEM: Foram eles! Foram eles, foram eles, eu vi, foram eles!
CHICO (OFF): Impressionante como isso aqui melhorou. Tem coisaspra fazer todo o tempo.
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(c) Jorge Furtado, 2001-2002.Casa de Cinema de Porto Alegrehttp://www.casacinepoa.com.br/

Roteiros

ILHA DAS FLORES roteiro de Jorge Furtado março/1989
produção: Casa de Cinema de Porto Alegre
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(1) Sobre fundo preto surgem, em letras brancas, sucessivamente,as seguintes frases:
ESTE NÃO É UM FILME DE FICÇÃO
ESTA NÃO É A SUA VIDA
DEUS NÃO EXISTE
(2) GLOBO: as frases desaparecem em fade e surge um globogirando, como no início de "Casablanca". Sobre e sob o globo,aparece o título do filme:
ILHA DAS FLORES
(3-5) MAPAS: fusão, ou corte, para mapas do Brasil, do Rio Grandedo Sul, até se ler "Belém Novo" no mapa.
FUSÃO PARA
(6) PLANTAÇÃO DE TOMATES: Câmera na mão avança numa plantação detomates em Belém Novo, em direção a um agricultor, japonês,parado no centro do quadro, olhando para a câmera.
LOCUTOR Estamos em Belém Novo, município de Porto Alegre, Estado do Rio Grande do Sul, no extremo sul do Brasil, mais precisamente na latidude trinta graus, dois minutos e quinze segundos Sul e longitude cinqüenta e um graus, treze minutos e treze segundos Oeste. Caminhamos neste momento numa plantação de tomates e podemos ver a frente, em pé, um ser humano, no caso, um japonês.
(7-10) JAPONÊS: Dois japoneses, no estúdio, de frente e deperfil, como nas fotos de identificação policial. Detalhe dosolhos e do cabelo.
LOCUTOR Os japoneses se distinguem dos demais seres humanos pelo formato dos olhos, por seus cabelos lisos e por seus nomes característicos.
(11-13) TOSHIRO: table-Top documentos do Toshiro. Carteira deidentidade, certidão de nascimento, impressão digital, exame desangue.
LOCUTOR O japonês em questão chama-se Toshiro.
(14-15) OS SERES HUMANOS: table-Top "As medidas do homem", doLeonardo da Vinci. Estátua grega.
LOCUTOR Os seres humanos são animais mamíferos, bípedes...
(16) BALEIA: imagem em vídeo de uma baleia.
(17) GALINHA: table-Top Desenho do Picasso.
LOCUTOR ... que se distinguem dos outros mamíferos, como a baleia, ou bípedes, como a galinha, principalmente por duas características:
(18) AULA DE ANATOMIA: mão enluvada segurando um cérebro, colocauma bandeirinha cravada no córtex.
LOCUTOR ... o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor.
(19-30) TELENCÉFALO: imagens de computador do cérebro. Edição deimagens de informações contidas no cérebro: equações, números detelefone, imagens de livros escolares, etc.
LOCUTOR O telencéfalo altamente desenvolvido permite aos seres humanos armazenar informações, relacioná-las, processá-las e entendê-las.
(31-40) MANIPULAÇÃO DE PRECISÃO: a primeira imagem deve serrelacionada com a última do telencéfalo, por exemplo, dedosvirando uma página do livro escolar. Imagens do movimento depinça, instrumentos cirúrgicos, pincel, baseado, indústriaeletrônica, mão depenando galinha.
LOCUTOR O polegar opositor permite aos seres humanos o movimento de pinça dos dedos o que, por sua vez, permite a manipulação de precisão.
BENEFÍCIOS DO PLANETA: (41) mão colhendo uma maçã na árvore, (42)gravura da expulsão de Adão e Eva do Paraíso, (43) gravura datorre de Babel, (44) Pirâmides, (45) Parthenon, (46) Loba romanacom os gêmeos, (47) capela Sistina, (48) 14 Bis, (49) bomba deHiroshima, (50) Coca-Cola com tampa rosca, (51) mão colhendo umtomate.
LOCUTOR O telencéfalo altamente desenvolvido somado a capacidade de fazer o movimento de pinça com os dedos deu ao ser humano a possibilidade de realizar um sem número de melhoramentos em seu planeta, entre eles, plantar tomates.
(52-58) TOMATES: pack-Shot tomates, gravuras de tomate em livrosde botânica e enciclopédias, pizza recebendo o molho.
LOCUTOR O tomate, ao contrário da baleia, da galinha, dos japoneses e dos demais seres humanos, é um vegetal. Fruto do tomateiro, o tomate passou a ser cultivado pelas suas qualidades alimentícias a partir de mil e oitocentos.
(59-60) TOMATES: gráfico da produção mundial de tomates com aporcentagem produzida pelo sr. Toshiro.
LOCUTOR O planeta Terra produz cerca de vinte e oito bilhões de toneladas de tomates por ano. O senhor Toshiro, apesar de trabalhar cerca de doze horas por dia, é responsável por uma parte muito pequena desta produção.
(61-65) ALIMENTAÇÃO: comidas utilizando tomate.
LOCUTOR A utilidade principal do tomate é a alimentação dos seres humanos.
(66-70) CARREGANDO: Toshiro carregando tomates na Kombi.
LOCUTOR O senhor Toshiro é um japonês e, portanto, um ser humano. No entanto, o senhor Toshiro não planta os tomates com o intuito de comê-los. Quase todos os tomates produzidos pelo senhor Thoshiro são entregues a um supermercado em troca de dinheiro.
(71-75) DINHEIRO: ilustrações de cédulas antigas, cédulas atuais,o manuseio do dinheiro, exemplo da troca feita ( mercadoria /dinheiro). Gráficos, bolsa de valores. (76) Giges: ilustração deenciclopédia. (77) Ásia Menor: mapa.
LOCUTOR O dinheiro foi criado provavelmente por iniciativa de Giges, rei da Lídia, grande reino da Asia Menor, no século VII Antes de Cristo.
(78-79) CRISTO: quadros da crucificação. Detalhe do INRI.
LOCUTOR Cristo era um judeu.
(80) OS JUDEUS: cenas do holocausto, em vídeo. "Noite enevoeiro", de Alain Resnais. Trator empurrando corpos para umavala.
LOCUTOR Os judeus possuem o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor. São, portanto, seres humanos.
(81-82) TROCA: balança com tomates e galinha. (83) Gráfico deequivalência baleia = galinhas.
LOCUTOR Até a criação do dinheiro, o sistema econômico vigente era o de troca direta. A dificuldade de se avaliar a quantidade de tomates equivalentes a uma galinha e os problemas de uma troca direta de galinhas por baleias foram os motivadores principais da criação do dinheiro.
(84-100) COMÉRCIO: Comerciais de tv, anúncios de revista,prateleiras de supermercado, vitrines de lojas, balaios deofertas, preços, líderes políticos fazendo acordo (vt).
LOCUTOR A partir do século III A.C. qualquer ação ou objeto produzido pelos seres humanos, frutos da conjugação de esforços do telencéfalo altamente desenvolvido com o polegar opositor, assim como todas as coisas vivas ou não vivas sobre e sob a terra, tomates, galinhas e baleias, podem ser trocadas por dinheiro.
(101) SUPERMERCADO: supermercado, mostrando o ritual de comprasdo carrinho ao caixa, passando pelos tomates. Dona Anete faz ascompras. Planos longos, em traveling.
LOCUTOR Para facilitar a troca de tomates por dinheiro, os seres humanos criaram os supermercados.
(102) DONA ANETE: dona Anete, no estúdio, de frente e de perfil,como nas fotos de identificação policial. Detalhe dos olhos e docabelo.
LOCUTOR Dona Anete é um bípede, mamífero, possui o telencéfalo altamente desenvolvido e o polegar opositor. é, portanto, um ser humano. Não sabemos se ela é judia, mas temos quase certeza que ela não é japonesa. Ela veio a este supermercado para, entre outras coisas, trocar seu dinheiro por tomates. Dona Anete obteve seu dinheiro em troca do trabalho que realiza.
(103) PORTÃO: Dona Anete entrando no portão de uma casa.
LOCUTOR Ela utiliza seu telencéfalo altamente desenvolvido e seu polegar opositor para trocar perfumes por dinheiro.
(104) PERFUMES: comercial de perfume, Avon.
LOCUTOR Perfumes são líquidos normalmente extraídos das flores que dão aos seres humanos um cheiro mais agradável que o natural.
(105-108) FÁBRICA DE PERFUMES: fábrica de perfumes. Várias etapasdo processo de fabricação dos perfumes.
LOCUTOR Dona Anete não extrai o perfume das flores. Ela troca, com uma fábrica, uma quantidade determinada de dinheiro por perfumes.
(109-110) VENDA DOS PERFUMES.: dona Anete na casa de uma cliente.Demonstração do perfume. A mesma cena do comercial.
LOCUTOR Feito isso, dona Anete caminha de casa em casa trocando os perfumes por uma quantidade um pouco maior de dinheiro. A diferença entre estas duas quantidades chama-se lucro.
(111) Letreiro: LUCRO.
LOCUTOR O lucro de Dona Anete é pequeno se comparado ao lucro da fábrica...
(112) SUPERMERCADO: Dona Anete no caixa, comprando carne de porcoe tomates.
LOCUTOR ... mas é o suficiente para ser trocado por um quilo de tomate e dois quilos de carne, no caso, de porco.
(113-116) PORCO: Desenhos de enciclopédia, porcos ao vivo,porquinho de desenho animado, porco cozido com maçã na boca, ostrês porquinhos. Detalhe pé do porco. Porco num matadouro.
LOCUTOR O porco é um mamífero, como os seres humanos e as baleias, porém quadrúpede. Serve de alimento aos japoneses e aos demais seres humanos, com exceção dos judeus.
(117-119) COMPRAS: dona Anete descarrega as compras. Cozinha,geladeira, armário.
LOCUTOR Os alimentos que Dona Anete trocou pelo dinheiro que trocou por perfumes extraídos das flores, serão totalmente consumidos por sua família num período de sete dias.
(120) DIA: representação astronômica do dia. Estúdio, maquete.
LOCUTOR Um dia é o intervalo de tempo que o planeta terra leva para girar completamente sobre o seu próprio eixo.
(121) CUCO: Relógio-cuco marcando 12 horas.
LOCUTOR Meio dia é a hora do almoço.
(122-126) FAMÍLIA: familia reunida na mesa. Dona Anete serve oalmoço. Dona Anete e Marido mostram as alianças. (127-135)Certidão de casamento da dona Anete. Fotos de casamento.
LOCUTOR A família é a comunidade formada por um homem e uma mulher, unidos por laço matrimonial, e pelos filhos nascidos deste casamento.
RECAPITULAÇÃO: mesmas imagens anteriores, bem rápido: (136)molho, (137) Toshiro, (138) compras, (139) Avon, (140) molho.
LOCUTOR Alguns tomates que o senhor Toshiro trocou por dinheiro com o supermercado e que foram trocados novamente pelo dinheiro que dona Anete obteve como lucro na troca dos perfumes extraídos das flores foram transformados em molho para a carne de porco.
(141-143) ÁREA DE SERVIÇO: Dona Anete joga tomate no lixo.
LOCUTOR Um destes tomates, que segundo o julgamento altamente subjetivo de dona Anete, não tinha condições de virar molho, foi colocado no lixo.
(144-150) LIXO: cenas da coleta de lixo, da cozinha até ocaminhão.
LOCUTOR Lixo é tudo aquilo que é produzido pelos seres humanos, numa conjugação de esforços do telencéfalo altamente desenvolvido com o polegar opositor, e que, segundo o julgamento de um determinado ser humano, num momento determinado, não tem condições de virar molho. Uma cidade como Porto Alegre, habitada por mais de um milhão de seres humanos, produz cerca de quinhentas toneladas de lixo por dia.
(151) GERMES: imagem de microscópio. Bactérias. (152-160) Imagensde doenças em livros médicos, hospital, Santa Casa.
LOCUTOR O lixo atrai todos os tipos de germes e bactérias que, por sua vez, causam doenças. As doenças prejudicam seriamente o bom funcionamento dos seres humanos. Outras características do lixo são o aspecto e o aroma extremamente desagradáveis. Por tudo isso, ele é levado na sua totalidade para um único lugar, bem longe, onde possa, livremente, sujar, cheirar mal e atrair doenças.
(161) CAMINHÃO DE LIXO: coleta.
LOCUTOR O lixo é levado para estes lugares por caminhões. Os caminhões são veículos de carga providos de rodas.
(162) ILHA DAS FLORES: placa de estrada passando, ponto de vistade quem está no caminhão de lixo.
LOCUTOR Em Porto Alegre, um dos lugares escolhidos para que o lixo cheire mal e atraia doenças chama-se Ilha das Flores.
(163) ÁGUA: traveling margem da ilha, com lixo e malocas, câmeraem um barco. Água do Guaíba.
LOCUTOR Ilha é uma porção de terra cercada de água por todos os lados.
(164) H2O: garrafa de vidro transparente, de laboratório,mostrando a cor da água. Estrutura molecular da água.
LOCUTOR A água é uma substância inodora, insípida e incolor formada, teoricamente, por dois átomos de hidrogênio e um átomo de oxigênio.
(165-170) FLORES: imagens de debutantes, calendários japoneses,gravuras de enciclopédia, girassóis do Van Gogh.
LOCUTOR Flores são os órgãos de reprodução das plantas, geralmente odoríferas e de cores vivas.
RECAPITULAÇÃO: mesmas imagens anteriores: (171) fábrica, (172)Avon.
LOCUTOR De flores odoríferas são extraídos perfumes, como os que do Anete trocou pelo dinheiro que trocou por tomates.
ILHA DAS FLORES: lixo na ilha: (173) traveling margem do rio,(174) lixo com saco.
LOCUTOR Há poucas flores na Ilha das Flores. Há, no entanto, muito lixo e, no meio dele, o tomate que dona Anete julgou inadequado para o molho da carne de porco.
(175) ILHA DAS FLORES: porcos na ilha. Porcos num chiqueiro.
LOCUTOR Há também muitos porcos na ilha.
RECAPITULAÇÃO: (176) Dona Anete jogando tomate no lixo, (177)porco comendo.
LOCUTOR O tomate que dona Anete julgou inadequado para o porco que iria servir de alimento para sua família pode vir a ser um excelente alimento para o porco e sua família, no julgamento do porco.
COMPARAÇÃO DONA ANETE / PORCO: (178) aula de anatomia, (179)porco parado, (179A) pé do porco.
LOCUTOR Cabe lembrar que dona Anete tem o telencéfalo altamente desenvolvido enquanto o porco não tem nem mesmo um polegar, que dirá opositor.
DONO DO PORCO: (180) dono da porco, em tele, ao lado da cerca;(181) detalhe do polegar escolhando dinheiro, fazendo umpagamento; (182) assinando; (183) dando ordens com o dedo; (184-185) dono do porco se vira.
LOCUTOR O porco tem, no entanto, um dono. O dono do porco é um ser humano, com telencéfalo altamente desenvolvido, polegar opositor e dinheiro. O dono do porco trocou uma pequena parte do seu dinheiro por um terreno na Ilha das Flores, tornando-se assim, dono do terreno.
TERRENO: (186) certificado de propriedade; (187) cerca, pessoasdo lado de fora, em fila.
LOCUTOR Terreno é uma porção de terra que tem um dono e uma cerca. Este terreno, onde o lixo é depositado, foi cercado para que os porcos não pudessem sair e para que outros seres humanos não pudessem entrar.
SEPARAÇÃO DO LIXO: (188) caminhão descarrega lixo na ilha, (189)empregados fazem triagem lixo/papel, (190) detalhe materialorgânico, (191) detalhe material inorgânico, (192) empregadoscarregando caixa, (193) triagem.
LOCUTOR Os empregados do dono do porco separam no lixo aquilo que é de origem orgânica daquilo que não é de origem orgânica. De origem orgânica é tudo aquilo que um dia esteve vivo, na forma animal ou vegetal. Tomates, galinhas, porcos, flores e papel são de origem orgânica.
(194-200) PAPEL: fábrica de Papel. Processo de fabricação dopapel. Celulose.
LOCUTOR O papel é um material produzido a partir da celulose. São necessários trezentos quilos de madeira para produzir sessenta quilos de celulose.
(201-204) Árvores sendo derrubadas. Folhas de papel. Lista decompras de dona Anete. Embrulho dos tomates.
LOCUTOR A madeira é o material do qual são compostas as árvores. As árvores são seres vivos. O papel é industrializado principalmente na forma de folhas, que servem para escrever ou embrulhar.
(205-206) PROVA DE HISTÓRIA: mão cata papel com prova de Históriano meio do lixo.
LOCUTOR Este papel, por exemplo, foi utilizado para elaboração de uma prova de História da Escola de Segundo Grau Nossa Senhora das Dores e aplicado à aluna Ana Luiza Nunes, um ser humano.
(207-210) Sala de aula. Alunos fazendo prova. Letreiro: TESTE DACAPACIDADE DO TELENCÉFALO DE UM SER HUMANO DE RECORDAR DADOSREFERENTES AO ESTUDO DA HISTÓRIA.
LOCUTOR Uma prova de História é um teste da capacidade do telencéfalo de um ser humano de recordar dados referentes ao estudo da História.
(211) MEM DE SÁ: gravura. Capa do "Grandes personagens da nossahistória". (212) Captanias hereditárias: mapa. Letreiro anterior(definição de prova de História) permanece.
LOCUTOR Por exemplo: quem foi Mem de Sá? Quais eram as capitanias hereditárias?
(213) HISTÓRIA: "Era uma vez" em um livrinho ilustrado, tipoBranca de Neve. Letreiro anterior vai sumindo, até ficar só apalavra RECORDAR.
LOCUTOR A História é a narração metódica dos fatos ocorridos na vida dos seres humanos. Recordar é viver.
(214-217) PORCOS: homem dá comida aos porcos. Porcos comendo.
LOCUTOR Os materiais de origem orgânica, como os tomates e as provas de história, são dados aos porcos como alimento. Durante este processo, algumas mulheres e crianças esperam no lado de fora da cerca na Ilha das Flores. Aquilo que os porcos julgarem inadequados para a sua alimentação, será utilizado na alimentação destas mulheres e crianças.
(218) MULHERES E CRIANÇAS: bando de mulheres e crianças noestúdio, olhando pra câmera; (219) mulheres e crianças de perfil;(220) mulheres e crianças mostrando os polegares.
LOCUTOR Mulheres e crianças são seres humanos, com telencéfalo altamente desenvolvido, polegar opositor e nenhum dinheiro. Elas não têm dono e, o que é pior, são muitas.
(221) PORTEIRA: mulheres e crianças aguardando na fila. (221A)Traveling na fila.
LOCUTOR Por serem muitas, elas são organizadas pelos empregados do dono do porco em grupos de dez e têm a permissão de passar para o lado de dentro da cerca. Do lado de dentro da cerca elas podem pegar para si todos os alimentos que os empregados do dono do porco julgaram inadequados para o porco.
ENTRADA NO TERRENO: (222) empregados controlando a entrada; (223)mulheres e crianças ao lado da cerca; (224) astros; (225) pessoascorrendo; (225A) catando comida; (225B) enchendo sacolas; (225C)detalhe do que pegam; (225D) capataz olhando relógio; (225E)detalhe do relógio.
LOCUTOR Os empregados do dono do porco estipularam que cada grupo de dez seres humanos tem cinco minutos para permanecer do lado de dentro da cerca recolhendo materiais de origem orgânica, como restos de galinha, tomates e provas de história.
(226-236) 5 MINUTOS: detalhes vários relógios.
LOCUTOR Cinco minutos são trezentos segundos.
(237) SEGUNDO: envelope com cartão, vai abrindo e aparecendo onúmero: 9.192.635.770.
LOCUTOR Desde mil novecentos e cinqüenta e oito, o segundo foi definido como sendo o equivalente nove bilhões, cento e noventa e dois milhões, seiscentos e trinta e um mil, setecentos e setenta mais ou menos vinte ciclos de radiação de um átomo de césio quando não perturbado por campos exteriores.
(238-244) GOIÂNIA: fotos das vítimas de Goiânia. (245) meninopassa substância brilhante em seu próprio rosto.
LOCUTOR O césio é um material não orgânico encontrado no lixo em Goiânia.
RECAPITULAÇÃO: mesmas imagens já mostradas anteriormente, cadavez mais rápido: (246) tomate na plantação, (247) Toshiro, (248)prateleiras do supermercado, (249) caixa, (250) Avon, (251)fábrica, (252) molho, (253) área de serviço, (254) porcorecusando, (255) pessoa catando lixo.
LOCUTOR O tomate plantado pelo senhor Toshiro, trocado por dinheiro com o supermercado, trocado pelo dinheiro que dona Anete trocou por perfumes extraídos das flores, recusado para o molho do porco, jogado no lixo e recusado pelos porcos como alimento, está agora disponível para os seres humanos da Ilha das Flores.
(256-259) CATADORES DE LIXO: Slow. Imagens ao longe, em tele, decatadores de lixo no meio do lixão.
LOCUTOR O que coloca os seres humanos da Ilha das Flores numa posição posterior aos porcos na prioridade de escolha de alimentos é o fato de não terem dinheiro nem dono. Os humanos se diferenciam dos outros animais pelo telencéfalo altamente desenvolvido, pelo polegar opositor e por serem livres. Livre é o estado daquele que tem liberdade. Liberdade é uma palavra que o sonho humano alimenta, que não há ninguém que explique e ninguém que não entenda.
(260) Menino pega o tomate e come. Cam fecha em seu rosto.
FADE OUT
FIM